A obra de Sigmund Freud, especialmente no que tange à sua concepção de inconsciente, representa um marco fundamental na compreensão da psique humana e na história da psicoterapia, como a concebemos hoje. Desde suas comunicações com Fliess e posteriormente no trabalho com Charcot e Breuer, que com este último resultou nos “Estudos sobre a Histeria” (1893-1895), Freud já introduzira a ideia de que a histeria era resultado de um recalque de ideias incompatíveis, onde o Eu repeliria estas para fora da consciência como uma forma de defesa. Essa concepção inicial estabeleceu a base para a compreensão do inconsciente como um sistema que opera por meio de mecanismos de defesa, como o recalque, e lançou as bases para o desenvolvimento posterior da teoria psicanalítica e da técnica com a qual praticamos.
Com o tempo, Freud aprofundou sua análise e desenvolveu a noção de que o inconsciente não é apenas um repositório de ideias reprimidas, mas compreende um sistema complexo de representações que se organizam segundo as leis do deslocamento e da condensação. Essa evolução culminou na primeira tópica, onde Freud delineou a estrutura da mente em três instâncias: o Isso, o Eu e o Super-Eu, cada uma desempenhando um papel distinto na dinâmica psíquica. Essa estrutura não apenas organiza a dinâmica psíquica, mas infere modos de operação de como as representações mentais são registradas e como podem ser acessadas ou reprimidas.
Na segunda tópica, Freud refinou ainda mais sua teoria, abordando como as ideias inconscientes podem emergir à consciência e a natureza dos conflitos psíquicos que surgem dessa dinâmica. Ele refutou hipóteses anteriores sobre a passagem do inconsciente para o consciente, enfatizando que essa transição não ocorre simplesmente por uma mudança de estado, mas envolve processos mais complexos de resistência e defesa. Essa visão amplia a compreensão do inconsciente como um espaço plural, onde impulsos, sentimentos e percepções coexistem, muitas vezes em conflito. O inconsciente por essência, carrega três características básicas:
A) ATEMPORAL: não opera na lógica formal da consciência (tempo cronológico)
B) SEM CONTRADIÇÃO: no inconsciente não há contradição, aceitando pulsões antagônicas e sem conflito
C) FUNCIONA PELA REALIDADE PSÍQUICA: opera pela lógica própria, baseada em associações, simbolismos, pelos processos metafóricos e metonímicos.
Essas características do inconsciente revelam a profundidade e a complexidade da psique humana, desafiando a visão tradicional de que a consciência é o único espaço onde os processos mentais ocorrem. A atemporalidade do inconsciente sugere que experiências passadas continuam a influenciar o presente, moldando comportamentos e emoções de maneiras que muitas vezes escapam à percepção consciente. A ausência de contradição permite que diferentes aspectos da personalidade coexistam, refletindo a rica tapeçaria de desejos e medos que compõem a experiência humana. Por fim, a lógica da realidade psíquica destaca a importância das associações e simbolismos, que podem se manifestar em sonhos, lapsos de linguagem e outros fenômenos, oferecendo uma janela para o entendimento das motivações subjacentes que guiam o comportamento humano.
A psicanálise, como método de exploração do inconsciente, continua a ser uma ferramenta valiosa na prática clínica, permitindo que sujeitos acessem e escutem das posições e lugares da sua psique. Ao iluminar as dinâmicas ocultas que moldam a experiência humana, Freud nos convida a considerar a complexidade do ser humano em sua totalidade, reconhecendo que a consciência é apenas uma parte do vasto e intrincado universo da alma humana.
FABRÍCIO DA SILVA
PSI
BBLIOGRAFIA:
FREUD, S. O inconsciente (1915). In FREUD, S. Escritos sobre a psicologia do
inconsciente. Rio de Janeiro: Imago Ed. 2006, vol. II. p. 13-74.
FREUD, S. (1923). O Ego e o Id. In: E.S.B., v. 19. Rio de Janeiro: Imago, 1990
BARATTO, Geselda. A Descoberta do Inconsciente e o Percurso Histórico de sua Elaboração. Psicologia: Ciência e Profissão, v. 29, n. 1, p. 74-87, 2009.
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